“Cada uma de minhas metades não poderia existir sem a outra. Pode-se amar a intempérie sem odiar a jaula? Viver sem morrer, nascer sem matar? Em meu peito, arena de touros, lutam a liberdade e o medo”.
Após praticamente quatro meses vivendo e tentando conviver neste mundo em pausa, adapto a frase acima de autoria de Eduardo Galeano para retratar esse cotidiano a espera do que chamam de novo normal. Acrescentaria a frase uma inversão: “Pode-se odiar a intempérie sem amar a jaula?” Tenho pressa, porque, hoje, mais do que nunca, a vida é um piscar de olhos. E não sou daqueles que encaram a morte nestas condições como uma fatalidade.
O mesmo Galeano disse que escrever seria sua maneira de “estar com os demais depois de morto”. De fato ele está com os demais depois de morto, por isso tenho pressa. Nunca ansiei tanto em publicar diante das incertezas que nos apresentam. Vivemos mergulhados nas incertezas. Como diz um amigo meu cuja praticamente toda família se envolveu com o Covid: “Que lição de vida”. Assim ele resumiu os tempos de tensão, acrescentando que nunca passou por uma situação de medo como essa.
Sim, a nossa realidade assusta. Nos deixa preocupados – e com medo – a cada notícia. Vejo metade de um presídio com seus confinados contaminados e um agente do Estado morto. Aí você pensa que esses presidiários estão sob a guarda do Estado. O que esperar do Estado também quando você vê uma notícia publicada no Página 3 com o seguinte parágrafo: “Em Itajaí e Balneário Camboriú os prefeitos adotaram discursos de cura com o uso de medicamentos ou protocolos sem eficácia comprovada, o que pode ter transmitido à população uma falsa sensação de segurança” e a curva de contaminados e mortes crescendo a cada dia revelando uma situação de descontrole.
Poderia aqui elencar muito mais notícias e informações que só confundem a nossa cabeça. Mas, não. Na verdade estamos largados sob o comando de políticos irresponsáveis e um presidente que acha normal a morte e que oferece cloroquina a ema.