Verão de 1987, o cantor pernambucano Alceu Valença foi uma das atrações do Festshow, um não tão bem sucedido evento de música em Balneário Camboriú que aconteceu numa tenda instalada bem em frente ao Auto Cine. Conversei com Alceu no lobby do Geranium onde apareceu sem barba – “fui fazer a barba e acabei fazendo um caminho de rato”. A entrevista foi publicada no Jornal de Santa Catarina.
Recordando alguns trechos da entrevista começando sobre alguns de seus álbuns:
Molhado de Suor – “É um disco lírico”.
Vivo – “Contestatório, muito na primeira pessoa, significando o porta voz de um grito”.
Espelho Cristalino – “Eu diria que o rock estaria ali, porque tinha uma pegada de rock”.
Na sequência do seu trabalho – “Eu passei uma época tocando com Jackson do Pandeiro e aprendi o gosto de fazer música, de trabalhar com ritmos. Pintou o lado mais negro de minha música, apesar de não ser negro. Mas a minha cultura é negra e absorvi isto na infância vendo os cocos, o maracatu, os forrós. Então a minha poesia se tornou cada dia mais preciosa. Eu perdi um pouco daquela coisa agressiva porque não aguentava mais gritar”.
Rubi – “Belo, puro, cristalino que não dá para ser discutido em outro nível”.
E depois do Rubi? – “Se eu continuar nessa vai virar meloso, o romântico, o chato. Eu estou atrás de uma coisa mais suja, contestatória, moleque. Eu cheguei a um ponto de maturação no meu trabalho que agora eu quero ser imaturo no meu próprio trabalho”.
Regional x Universal – “Uma música de Ray Charles é universal. É uma música que vem dos negros do sul da América. Ela é tão regional quanto a música de Luis Gonzaga (…) agora, simplesmente a música de Ray Charles teve uma alavanca para mover o mundo. Esta alavanca é o dinheiro, é a máquina americana”.
Regional x Universal – “Evidentemente a máquina que assessora minha música é muito menor do que a que assessora Mick Jagger ou Michael Jackso. Se me dessem uma máquina igual eu seria no mínimo igual a eles porque minha música é boa pra caramba e eu sou um artista do c… êta porra! (risos).
Pergunta cretina – “Uma vez cantei num festival na Suiça e o locutor me fez essa pergunta que acho meio cretina, meio facistóide: ‘O que você acha de cantar depois de Joan Baez?’ Eu digo: o que ela acha de cantar antes de mim” (risos).
O novo, a meia idade e a velhice – Eu gosto muito do ancião porque ele é criança, chega perto da criança. Eu não gosto muito da meia idade porque ela é careta sempre. O velho não está esperando mais nada, o novo está querendo muito e o meio está guardando para a velhice. Eu não quero ser careta porque ser careta é ser reacionário, é ser conservador, deixar que o estabelecido lhe consuma”.
Entrevistei Alceu uma segunda vez para o Página 3. Certo dia estava em São Paulo quando vi Alceu atravessando a rua. Claro, fui em sua direção e me apresentei recordando das entrevistas. Ele lembrou na hora e ainda comentou que foram duas entrevistas bem malucas.